terça-feira, setembro 13, 2011

Canção de mim mesmo
1
"Eu celebro o eu, num canto de mim mesmo,
E aquilo que eu presumir também presumirás,
Pois cada átomo que há em mim igualmente habita em ti.

Descanso e convido a minha alma,
Deito-me e descanso tranquilamente, observando uma haste da
[relva de verão.

Minha língua, todo átomo do meu sangue formado deste solo, deste ar,
Nascido aqui de pais nascidos aqui de pais o mesmo e seus pais
[também o mesmo,
E agora com trinta e sete anos de idade, com saúde perfeita, dou
[início,
Com a esperança de não cessar até morrer.

Crenças e escolas quedam-se dormentes,
Retraindo-se por hora na suficiência do que são, mas nunca esquecidas,
Eu me refugio pelo bem e pelo mal, eu permito que se fale em
[qualquer casualidade,
A natureza sem estorvo, com energia original."

37
"Vós molengões que estais de guarda! Atentai para vossas armas!
As multidões estão nos portões conquistados! Estou possesso!
Incorporo todas as presenças foras da lei ou sofredoras,
Vejo-me na prisão na forma de um outro homem,
E sinto a dor entorpecida e ininterrupta.

Por mim os guardiões dos condenados carregam nos ombros as
[suas carabinas e ficam vigiando,
Permitem que eu saia de manhã e me prendem à noite.

Não há um só amotinado caminhando algemado para a cadeia sem
[que eu esteja algemado a ele e caminhando ao seu lado
(Eu não sou o entusiasmado que vai ali, sou, sim, o silencioso com 
[suor em meus lábios retorcidos.)

Nenhum jovem é pego por furto sem que eu seja  preso junto dele, e
[com ele sou julgado e sentenciado.

Nenhum paciente com cólera dá seu último suspiro sem que eu
[também dê meu último suspiro,
Meu rosto tem a cor das cinzas, meus tendões se retorcem, as
[pessoas se retraem à vista de mim.
Pedintes se incorporam em mim e eu incorporo neles,
Estendo meu chapéu, sento com rosto envergonhado e esmolo."

40
"Ostentação do brilho do sol, não preciso do seu calor - relaxa!
Iluminas apenas a superfície, eu forço as superfícies e as profundezas
[igualmente.

Terra! Pareces procurar algo em minhas mãos,
Dize, velho elevado, o que desejas?

Homem ou mulher, eu gostaria de dizer o quanto gosto de ti, mas
[não posso,
E talvez dizer-te o que há em mim e o que há em ti, mas não posso,
E talvez dizer-te que anseios eu tenho, aquele pulso de meus dias e
[noites.

Atenção, não dou palestras nem faço um pouco de caridade,
Quando dou algo, dou-me por inteiro.

Tu que estás aí, impotente, de pernas bambas,
Abre o lenço que cobre a tua boca até que sopre coragem pra
[dentro de ti,
Abre as palmas de tuas mãos e ergue as abas de teus bolsos.
Não posso ser rejeitado, posso compelir-te, tenho abundância de
[depósitos, tenho-os de sobra,
E tudo que tenho eu ofereço.

Não pergunto quem és, isso não importa pra mim,
Nada podes fazer, nem podes ser alguma coisa diferente do que eu
[te moldar.

Ao escravo dos campos de algodão ou aos limpadores de latrina me
[inclino,
Em sua face direita deixo o meu beijo familiar,
E em minha alma juro que nunca o negarei.

Em mulheres prontas para a concepção, gero bebês maiores e mais
[ágeis,
(Hoje estou atirando a essência de repúblicas muito mais arrogantes.)

A qualquer um que esteja morrendo, corro para alcançá-lo e viro a
[maçaneta da porta,
Viro os lençóis na direção do pé da cama,
Permito ao médico e ao padre que voltem para casa.

Pego o homem que cai e levanto-o com vontade irresistível,
Ó desesperado, aqui está o meu pescoço,
Por Deus, não podes cair! Solta todo seu peso sobre mim.
Eu te dilato com um sopro tremendo, te faço boiar,
Todos os quartos da casa sinto com uma força armada,
Amantes de mim, estorvos dos túmulos.

Dorme - eu e eles vigiaremos a noite inteira,
Nem dúvida, nem doença ousarão colocar um dedo sobre ti,
Eu te abracei, e daqui em diante eu te possuo.
E quando te levantares pela manhã, saberás que o que te digo é
[verdade."

Walt Witman - Folhas de Relva

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